sexta-feira, 29 de junho de 2012

Olhos negros desconcertantes... - Parte 6





                                                                       
                                                                                6.



“Ora, as sereias têm uma arma ainda mais terrível do que o seu canto, a saber, seu silêncio. Embora nunca tivesse acontecido, é talvez concebível que alguém pudesse ter escapado de seu cantar, mas de seu silêncio, certamente não.”

                                                                             (Franz Kafka, O silêncio das Sereias).


O gato preto da janela...

 A má sorte me persegue... Não que acredite nestas coisas de “passar embaixo da escada rouba-lhe a sorte” ou que “cruzar com gato preto causar-lhe-á azar no resto da semana!”. Os fatos sucessores ao casamento de Antônio deixavam-me perplexa! Atrasara-me para o trabalho a semana inteira, as repreensões de meu chefe vieram logo e tudo que comecei nestes dias jamais terminei!
 Petrus levou minha segurança, minha altivez, meu equilíbrio, minha sensatez e tudo que fazia-me ser Madalena. O amor, por enquanto, não me tem sido de grande importância ou valorização. Claro, estou disposta a ter amor e a dá-lo com intensidade maior possível, mas não hoje, muito menos amanhã. O que quero dizer, é que quando deixamos o amor de lado ficamos tão perdidos, que é quase impossível continuar sem dar marcha ré, passar por cima de qualquer mania adquirida e, então, fazer um novo caminho. A verdade é que querendo ou não o amor virá, ora ele, ora o ódio e por mais clichê seja, a ligação entre eles é verdadeira e muito mais palpável do que muitos imaginam!
 Os gatos pretos de azar tornaram-se um muro em frente a minha janela...
Exatamente! A perdição é como ter um muro em frente à janela. (Não a “perdição” no mais puro termo, mas sim no caso de estar perdido! Deste modo quero que a vejam e sintam neste caso...). Era isto! Estava perdida... Perdida em minhas escolhas. Perdida nas suposições para o futuro! Contudo, ainda assim, não me apeguei ao fato de não saber como encontrar Petrus e, mesmo que soubesse, meu orgulho de mulher falaria mais alto!
 Como escreveu Oscar Wilde: “O diabo é muito otimista se pensa que pode piorar os homens”. 
 A semana terminou ainda pior do que havia começado. Sai ilesa do trabalho, além da advertência (muito bem posta por meu chefe!), os “demais” de minha vida iam bem. O que mais incomodaria no meu cotidiano? Moro sozinha, mas nunca pude morrer de solidão, já que recebia visitas diárias de um gato em minha varanda. Meus contatos permaneciam superficiais, literalmente.  Certo dia, meu companheiro das noites, subiu calado em minha janela. Cansada de tanta invasão e muito mais, cansada do silêncio; caminhei para pertinho e puxei um assunto tão supérfluo quanto aquela situação.
- Olá, como se sente hoje? Se quiseres, nem precisamos levar em consideração que sejas apenas um gato...
 - (silêncio)...
- Desculpe-me se lhe peguei de surpresa! Não sou muito de falas e sei que tu também não és, mas bem sabes que o ser humano precisa, às vezes, de um aconchego.
- (silêncio)...
- Por favor...
 Foi nesse instante, que deixando de lado qualquer cordialidade ou educação, “Senhor gato” deixou-me a falar sozinha e saiu a caçar a borboleta branca que passava. Quando já se ia lá ao longe acredito que lembrou-se de minha companhia, virou-se para trás e miou alto e agudo.  Era o aviso que voltaria pela manhã...

Farias, Maikéle. "Olhos negros desconcertantes - Parte 6". Junho de 2012. http://livredialogo.blogspot.com.br/
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quarta-feira, 27 de junho de 2012

O dobrador de papel.

Sei que para muitos isto pode parecer à coisa mais idiota do mundo, ou pode não significar absolutamente nada, mas o que vou lhes contar é algo extremamente importante para mim.
Tudo começou numa manhã de aula, era sábado, eu estava sozinha e as primeiras aulas eram vagas.
Um amigo me chamou para assistir aula junto com ele, assim eu não ficaria sozinha.
No início todos ficaram me olhando, apenas uma pessoa percebeu a minha presença ali. Notei que ele estava um pouco distraído, mas sabia que estava sendo observado e resolveu conversar comigo, foi aí que surgiu uma grande amizade.
Comecei a prestar atenção ao que o garoto fazia, era tão lindo, desde a agilidade das mãos até o olhar fixo no pedaço de papel. Seu rosto apresentava uma expressão agradável, parecia estar alegre e seus olhos brilhavam. O papel parecia prender seus olhos, mas não prendia as suas palavras.
Eu jamais vi coisa mais linda e verdadeira antes.
O que mais me surpreendeu foi quando ele finalmente levantou os olhos e me olhou, ele ficou completamente imóvel por alguns segundos, que na verdade pareciam ser eternos, nossos olhos estavam fixos, foi neste momento que recebi algo que não se compra, mas se conquista.
Enfim a única coisa que restou deste dia foi uma flor de papel dobrado, um dos presentes mais valiosos do mundo, pois não era apenas um pedaço de papel, era o símbolo de uma amizade.
Nunca mais eu o vi, mas em meu pensamento vejo um amigo de voz doce que me deu um pedacinho de carinho que estará guardado eternamente em meu coração... 

Pereira, Joana. "O dobrador de papel". Junho de 2012. http://livredialogo.blogspot.com.br/
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segunda-feira, 25 de junho de 2012

Muros


Ele está lá. Preso na liberdade do seu dinheiro, preocupado com as espinhas que vão surgir com o excesso de chocolate que carrega consigo. Assistindo a estreia do filme novo com os amigos presunçosos. Do outro lado do muro onde ele mora está uma família que vive na incerteza se o pai voltará para casa com comida. Vive vários garotos punidos com uma dura realidade que eles fogem indo soltar pipa.  A criança acreditou no homem que vestia terno e olhava pela câmera como se realmente estivesse falando com ela. A criança acreditou que esse homem iria descer do confortável carro e pisaria na realidade que ela vive.
Então, eis que se rebelou o rapaz que sempre é humilhado por causa de suas condições de vida, o menino calmo carrega ódio nos olhos, e a vermelhidão que trás consigo no olhar é o efeito da droga se manifestando. Não apresentaram a solução para o rapaz, mas apresentaram as drogas. Ele desce e sobe o morro várias vezes ao dia, servindo de entregador para manter o próprio vicio. A família não o vê mais em casa, as raras vezes que ele aparece é para pegar alguma coisa para vender, e a mãe fica fazendo costuras o dia todo na sala da casa para ajudar no sustento da casa.  Mais um morador do bairro vitima de assassinato, a mãe abandona a maquina de costurar e fica atenciosa ao fato noticiado, mas não há com o que se preocupar é apenas outro consumidor de drogas que não quitou as dividas e pagou com a vida, não há necessidade de alarme, esse seria outro bandido motivado pelo vicio.  Crianças, jovens, adultos todos estão dividindo o mesmo céu, o mesmo ar.  Nascer, Crescer, Reproduzir e morrer, Já que as leis naturais parecem ser iguais para todos porque detrás daquele muro tem outra realidade? Outro mundo cheio de  temor?
O menino continua sorrindo com os amigos pela piada de um astro de Hollywood, ele falava das milhares de operações feitas para ficar bonito, mas para que pagar caro para ficar bonito, se do outro lado do muro está cheio de pessoas necessitando das condições básicas de humanização. 
Será sempre assim? O muro sempre vai está erguido dividindo as realidades opostas? Ou um dia a sociedade derrubará todos os muros que ainda estão erguidos entre uma vida e outra. Daremos outro grande salto, da mesma forma como foi feito ao muro de Berlim? Ou vamos viver para sempre acomodados a nossa própria realidade?


 Menires, Ana. "Muros". Junho de 2012.  http://livredialogo.blogspot.com.br/
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sexta-feira, 22 de junho de 2012

A alegria da casa.

Nasci em uma família humilde, de meus doze irmãos sou eu a mais nova, até meus cinco anos, morei em um rancho de palha com piso de chão batido. Dormia no mesmo quarto de meus pais, qual um bebezão, em um berço – meu berço – que foi aumentado para servir-me de cama. Apesar da condição modesta, sempre fui muito feliz nesse lugar. Recordo-me com saudosa lembrança que nosso rancho ficava em uma bela planície; possuíamos um pomar bastante sortido que era cuidado por meu pai, e um belo jardim mantido por minha mãe Noêmia. Ah...! Quanta saudade de meus pais... Meus heróis, meus super-heróis! Saudade de uma época em que não sabia o que era a maldade, em que era protegida e muito amada por minha família.

Recordo-me também de como tudo era difícil naquela época... não havia escola para frequentarmos, e com poucos recursos para contratar um professor particular, o conhecimento, ainda que parco, era transmitido de uns para os outros. Minha irmã e madrinha, Aida, foi quem ensinou-me as letras.

Como a família era grande, todos nós ajudávamos no serviço da casa. Ainda muito jovem ia para o arroio lavar roupas. Certa vez, Rosa minha irmã, ao carregar-me em um carrinho-de-mão acabou por me derrubar por sobre uma pedra, onde bati com o tórax. Claro que nada contamos a nossos pais sobre o incidente! Só ficaram sabendo algum tempo depois porque se formou um abscesso e precisei ir ao médico; no final das contas, tive de passar por um processo cirúrgico.

Aos meus seis anos um tio apelidou-me de “Alegria da casa”, pois eu gostava muito de cantar e dançar, aliás, aprendi a dançar com o senhor Aufeu Rosa, que punha-me sobre seus pés dizendo: “serás uma grande bailarina, pois estás aprendendo a dançar com um negro”. “Seu” Aufeu foi uma figura muito carismática, criou-se em nossa família e, portanto, era tido como parte dela.

Eu tinha por entretenimento fazer crochê, guardo até hoje meu primeiro feito: um singelo guardanapinho. Nossa diversão eram as serenatas, as comemorações de aniversário em família, os bailes... E como não mencionar a memória que mais amo, que me faz emocionar ao lembrar? Dos Sábados de Aleluia, quando meu pai acordava-nos ainda muito cedo ao som de gaita, com grande alegria, festejando, e passávamos a noite em churrasco familiar.

Minha irmã mais velha, Iolanda, casou-se bastante nova, eu costumava chamar seu marido de “tio”, “tio Alexandre”, apesar de ele ser apenas meu cunhado. Era uma forma carinhosa e familiar de tratá-lo. Eu gostava muito de pernoitar na casa deles, pois seu filho mais velho, meu sobrinho, Assis, tinha quase a mesma minha idade, assim, distraiamo-nos brincando e ouvindo as historietas fantásticas de assombrações e também os causos pilhéricos que “tio” Alexandre contava-nos. Quando eles se mudaram de seu rancho próximo ao nosso para a Venda da Lata, eu passei a chamar o lugar de “tapera do ‘tio’ Alexandre”. Foi ele uma pessoa que marcou demasiadamente minha infância.

Quando completei dez anos, abriu-se a primeira escola que tive condições de frequentar, situada na Venda da Lata. Por esta idade comecei a cursar a primeira série. Foi isto algo tão importante para mim, que recordo-me até mesmo o nome de minha primeira professora: Maria Helena Rodrigues! Nessa escolinha aprendi a declamar, a ter gosto pelas artes... Junto a outros colegas e a professora Maria Enilda Santos, fundamos um CTG, onde passamos a aprender as danças folclóricas – a propósito, aprendemos muito sobre o folclore gaúcho. E, eu que não gostava disso estava sempre engajada aos eventos... Quando passei a estudar na então Escola Ponche Verde, ingressei também em seu corpo de danças, onde participei de alguns eventos.

Outra lembrança que possui matizes formidáveis em minhas reminiscências é o de meu primeiro baile no “20 de Setembro CTG”.  Eu tinha 15 anos e foi nessa época que comecei a aflorar para meus primeiros amores, ainda que minha mãe, muito conservadora e protetora, jamais me deixasse a sós, aliás, não descuidava de mim um segundo sequer!

Prossegui minha jornada acadêmica e, em 1975 comecei a dar aulas na Escola Venda da Lata – vejam quanta coincidência! O começo de minha vida acadêmica e o de minha vida profissional foram no mesmo lugar: na Venda da Lata. Em 1987 recebi meu diploma do Curso de Magistério da então Escola de 1º e 2º graus Ponche Verde.

Com o passar do tempo, encontrei aquele que foi meu amor maior, aquele que escolhi como companheiro a trilhar os caminhos da vida, meu marido Elton, pai de meus dois amados filhos. Prossegui a lecionar até meus 53 anos, quando me aposentei. Hoje, viúva, vejo meu casal de filhos crescidos, casados e prósperos em suas vidas, que me presentearam com 05 netos, ao quais amo muito – avó é mãe duas vezes; mãe com açúcar... Na solidão de minha casa, através das brumas do tempo e de minhas, um pouco turvas, memórias, narro estas poucas reminiscências que apaziguam a saudade de um tempo que me é tão caro...

Memória literária escrita com base no relato de minha tia-avó Doralina. 

         Farias, M.S. "A alegria da casa." Junho de 2012. http://livredialogo.blogspot.com.br/
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terça-feira, 19 de junho de 2012

Vendo longe.


Todos os dias ele olhava
Pela mesma janela
Já estava cansado do que via!
Todo dia tudo tão igual... queria outra janela

Todos os dias ele mirava as estrelas
Sabia que estavam todas tão longe...
Sempre as via na mesma posição...
Queria vê-las do Hemisfério Norte!

Via-ouvia todo dia a mesma guria
Nem ele queria ela, nem ela o queria
Ambos sonhavam alto, viam longe
Queriam estar longe

Um dia ele deixou tudo para trás
E foi atrás do tal "longe"
Chegando no tal "longe" viveu...
                                                 viveu feliz para sempre

("Mas que poema sem graça, esse!
Eu quero é continuação!"
Sim, haverá continuação,
Mas como será talvez nem o tempo saiba)

Douglas Dutra. "Vendo longe". Maio de 2012. 
Café, Poesia & Ideias.

domingo, 17 de junho de 2012

Luna!


“A cigana pomba-gira de olhos quase encarnados ou meio insolentes. És rosa azeda, Luna! Luna de minhas ilusões suplicantes; de meus martírios estratégicos...”     

 Luna, por que não ouves?

Já que estes são martírios estratégicos;
se estas são tuas ilusões suplicantes?
Luna, não te deites na relva que a morte nos entrega,
não te percas a clarear a escuridão que não te renega
e, jamais! Jamais dance com o abutre que não vês...
Luna não tome por pouco minhas poesias,
Quem "mo" dera se aí do além
tu fosses minha poetisa
E olhasse-me estes versos sem desdém...
Só de inspiração não me basta o choro,
que das luas tirou-lhes o brilho
Vagam-se nuas de qualquer encanto,
P’ra um canto que não sei, nem sinto!                                                                         





Farias, Maikele. 
"Luna!". Junho de 2012. http://livredialogo.blogspot.com.br/
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Maneira de amar.

O jardineiro conversava com as flores e elas se habituaram ao diálogo. Passava manhãs contando coisas a uma cravina ou escutando o que lhe confiava um gerânio. O girassol não ia muito com sua cara, ou porque não fosse homem bonito, ou porque os girassóis são orgulhosos de natureza.

Em vão o jardineiro tentava captar-lhe as graças, pois o girassol chegava a voltar-se contra a luz para não ver o rosto que lhe sorria. Era uma situação bastante embaraçosa, que as outras flores não comentavam. Nunca, entretanto, o jardineiro deixou de regar o pé de girassol e de renovar-lhe a terra, na devida ocasião.

O dono do jardim achou que seu empregado perdia muito tempo parado diante dos canteiros, aparentemente não fazendo coisa alguma. E mando-o embora, depois de assinar a carteira de trabalho.
Depois que o jardineiro saiu, as flores ficaram tristes e censuravam-se porque não tinham induzido o girassol a mudar de atitude. A mais triste de todas era o girassol, que não se conformava com a ausência do homem. "Você o tratava mal, agora está arrependido?" "Não, respondeu, estou triste porque agora não posso tratá-lo mal. É a minha maneira de amar, ele sabia disso, e gostava".
 Carlos Drummond de Andrade

segunda-feira, 11 de junho de 2012

Família, base magna da sociedade.

No ano pretérito elaborou-se um texto abordando sobre a importância do jovem, seu papel ante a sociedade. O texto intitulado “Jovem, o pilar do porvir” frisa que a base de uma sociedade, sua perpetuação, melhorias et coetera depende quase que unicamente dos jovens, e que portanto faz-se vital que estes recebam letramento de alta qualidade e incentivos positivos com relação à seu futuro profissional, enquanto componentes primordiais da estrutura politicamente concebida a que denominamos sociedade.

Tão relevante quanto o ambiente familiar – base dos valores ético-morais e do caráter -, é a escola, pois é nela onde serão legados os conhecimentos necessários à formação cognitiva, política, social e cultural do indivíduo. O professor assume um papel deveras importante uma vez que seja ele o transmissor não apenas de conhecimentos, como também um espelho, um exemplo a ser seguido por seus discípulos. A forma como o mestre procede na escola colabora para a composição do caráter do indivíduo aluno, pois, esta qualidade inerente, sofre em sua formação a influência do ambiente que cerca a pessoa. Destarde faz-se recomendável que, durante a infância e até mesmo durante a primeira parte da adolescência o jovem seja inserido em um ambiente com exemplos positivos à sua formação, ainda que convicções intrínsecas tenham tanto ou mais peso que o ambiente onde fora criado o individuo.

Coetaneamente observa-se que ainda muito novos, os jovens estão aderindo à criminalidade, não apenas em contextos considerados “leves” como, por exemplo, comportamentos ofensivos, como também ao terrível crime organizado e o tráfico de entorpecentes. Em decorrência disso, há surgido um assunto bastante polêmico com relação ao “E.C.A.” (Estatuto da Criança e do Adolescente) que, em suas disposições, muitas vezes, aos olhos de muitos, é ineficaz e acaba por não cumprir o seu dever: punir o delinquente e readaptá-lo à sociedade de forma a não mais incorrer em ações criminosas. Para alguns faz-se necessárias disposições mais ferrenhas e a diminuição da idade penal de 18 para 16 anos, não obstante, há quem defenda a permanência das disposições quanto à idade penal bem como as vinditas e cobram melhor aplicação do Estatuto e a contratação de profissionais capacitados e estrutura adequada das casas de reabilitação.

Os fatores que levam o jovem à vida criminal são vários, sendo mais comuns: o abandono escolar, as más condições sociais e falta de expectativa de um futuro melhor seguindo os preceitos legais da sociedade, o que faz com que estes jovens optem pela “carreira criminal”, uma vez que para o tráfico de drogas e quadrilhas não se exige aptidões acadêmicas, tampouco nenhuma burocracia, basta disposição. Um “trabalho fácil”, ao limbo da lei, com boa remuneração, enquanto que, dentro da lei, é necessário estar em constante aprendizagem, em busca de um alto padrão profissional e intelectual - em razão do mercado de trabalho cada vez mais competitivo – e esforçar-se muito para adquirir um bom emprego e receber um bom ordenado.

É preocupante o desvaler moral e ético, a inversão de valores que está se instaurando em nossa sociedade. A entropia toma conta de tal forma que, comportamentos impudicos, falta de reflexão, ações torpes e coisas afins tornaram-se “populares”, enquanto que, o pejo, a reflexão, cortesia, educação et coetera estão a tornar-se impopulares. Músicas que há três decênios seriam consideradas não apenas uma agressão à sociedade, mas também vazias e parvas, hoje são voga, em contrapartida, músicas com conteúdo, letras que são verdadeiras poesias são consideradas ridículas. O vernáculo está sendo vulgarizado demasiadamente, é lastimável tomar um romance grafado há 100 anos em uma linguagem à época tida por trivial e constatar que atualmente ela é vista como formalíssima, difícil.

O conceito de família como instituição sagrada, reduto dos bons costumes, da preparação de pessoas idôneas, decentes, está se perdendo. Durante muito tempo as famílias preparavam os jovens para o seu futuro profissional de forma bastante severa, os valores morais, religiosos e outros tantos que regem a vida em sociedade eram legados e praticados com apuro. A educação era elemento primordial da formação do jovem, a exigência de que tivessem um conhecimento erudito e reflexivo assim como um ideal de honra a ser preservado levavam a formação de um caráter agudo, de um indivíduo responsável, determinado e esclarecido. Infelizmente, hoje as famílias já não são assim, muitas sequer são formadas por um casal e legam a educação dos filhos, que deveria ser responsabilidade inalienável dos pais, à escola que deveria ter como competência única legar conhecimentos acadêmicos, culturais, desenvolver o pensamento reflexivo e lógico, enfim, as aptidões sociais e cognitivas.

Sem jovens não temos esperança de um futuro para a sociedade, tampouco de melhorá-la. É necessário mais que nunca se investir em qualidade de ensino, em profissionais mais qualificados, incentivar, sobretudo, o jovem em buscar um futuro cada vez melhor não apenas para si, mas para toda a humanidade, em aperfeiçoar-se como profissional e ser humano, com respeito à vida. Perpetuar os valores, o pejo, o respeito mútuo. Evoluir tecnológica e cientificamente, porém sem delir a estes conceitos e valores. Do jovem depende a sociedade, o jovem depende da família.

“O homem só vale pelo que sabe. Saber é poder. Os sábios ensinam pelo exemplo, e não há o que avassale o espírito humano mais suave e profundamente que o exemplo. Não deve, porém, o homem cultivar a ciência senão para utilizá-la na prática do bem”. (Beremis Samir, “O Homem que Calculava”. Tahan, Malba. Rio de Janeiro, Record, 2010. 300 p. 79° ed.).

“A família é base da sociedade e o lugar onde as pessoas aprendem pela primeira vez os valores que lhes guiam durante toda sua vida.” (Beato Papa João Paulo II).

“O futuro depende, em grande parte, da família, leva consigo o porvir mesmo da sociedade; seu papel especialíssimo é o de contribuir eficazmente com um futuro de paz.” (Beato Papa João Paulo II).





Farias, M.S. "Família, base magna da sociedade". Junho de 2012. http://livredialogo.blogspot.com.br/
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domingo, 10 de junho de 2012

Algo importante às religiões...


 Cantiga Por Um Ateu 
(Padre Zezinho, SCJ)

Um grande amigo meu
Que a sua fé perdeu,
No dia de Natal me procurou.
Contou-me a sua vida 
Tão cheia de incertezas
Com tanta honestidade
Que me fez chorar.
E a lágrima teimosa caindo no meu rosto
Lavou meu preconceito de cristão.

Eu sei que da verdade eu não sou dono,
Eu sei que não sei tudo sobre Deus.
Às vezes, quem duvida e faz perguntas,
É muito mais honesto do que eu.

Ao grande amigo meu
Que a sua fé perdeu,
No dia de Natal me confessei.
Contei-lhe a minha vida
Tão cheia de procuras
Com tantas esperanças
Que ele até sorriu.
E aquele riso aberto
Nos trouxe bem mais perto,
Lavou seu preconceito de ateu.

Por este amigo meu
Que a sua fé perdeu,
Naquele mesmo dia eu fui rezar.
E a minha prece amiga
Gerou esta cantiga
Que eu fiz pensando muito
Em meu país cristão.
Às vezes muita gente
Não crê no que acredita
E afasta o seu irmão da religião.

quinta-feira, 7 de junho de 2012

Olhos negros desconcertantes... - Parte 5


  5.

“Ao rosto sobe-me o sangue tímido; em meu manto envolve-o até que o amor esquivo já se tendo tornado corajoso, só inocência veja no ato do amor sincero e puro.” 
(William Shakespeare, "Romeu e Julieta").

Águas de Março...

O mês não era de frio, mas assim que tocou meus lábios Petrus me fez congelar. Não literalmente, claro! (Até me pergunto se isto é possível...). Minha salvação ou minha perdição estava ali naquele homem. O desconhecido agora fazia parte de mim; parte que eu não sabia que tamanho tinha, que não sabia que poder teria e exerceria, mas que, em um minuto, eu havia aprendido a respeitar! Em alguma de minhas muitas leituras, aprendi que quando queremos experimentar algo precisamos cair de cabeça. Como tentar analisar a temperatura da água do mar, apenas molhando os pés... E meu corpo, naquele instante, me implorava pra mergulhar! 

“- São as águas de março fechando o verão. É a promessa de vida no teu coração!”
Mergulhei. 

Petrus era alto e tinha os braços fortes. Usava o cabelo num comprimento que não passava dos ombros... Tinha cara de professor. Logo, qualquer coisa que ele dissesse me pareceria verdade; era como se sua essência saísse de seu próprio corpo e mudasse a opinião de qualquer pessoa sobre qualquer coisa.

- Madalena... 

Bastou uma palavra para que voltasse a terra. Cambaleei e me afastei com alguns passos para trás. Queria correr, talvez, por vergonha ou arrependimento, mas meus pés não se firmavam ao chão. Levava a mão ao peito quando Petrus me deteve. Segurou meu braço com tanta força que gritei de dor; no mesmo momento, algum barulho surgiu do meio da escuridão. Meu acompanhante me puxou para trás de alguns arbustos onde havia um espaço mínimo para nossos corpos. Estávamos colados! E, então, pela primeira vez, senti nossos corações pulsarem juntos, num compasso, numa sinfonia inaudível. Nossa canção... 
                                  
- Que está fazendo? – Perguntei, assim que achei apropriado. Um sorriso foi minha resposta. Um sorriso tranquilizador... Seus olhos me diziam: Confie! Entretanto, eu não podia. Madalena era uma mulher confiante em si, não aquele animalzinho amedrontado que Petrus fazia parecer. Eu não me deixaria cair em uma armadilha infantil.       

- Olha...

Antes que pudesse terminar os ruídos ao redor voltaram. Alguém, além de nós, também estaria passeando por aquele estranho lugar? 

- Olha... 

Meu acompanhante segurou-me o rosto para que nossos olhos se fixassem. Um minuto! Bastou um minuto para que seus olhos negros e tumultuados desarmassem todos meus planejamentos, toda a minha confiança. Então ele partiu sem ruídos, sem culpa. Sem mim... Partiu como as sereias com seu silêncio. Como as sereias que não cantam; que, de folga, não hipnotizam, mas assim mesmo matam. 

“- Non te scorda di me...”

Farias, Maikele. "Olhos negros Desconcertantes... - Parte 5". Junho de 2012. http://livredialogo.blogspot.com.br/
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sexta-feira, 1 de junho de 2012

Resenha do livro "A Menina que roubava livros", de Markus Zusak.

Zusak, M. A menina que roubava livros. Rio de Janeiro, Intrínseca, 2008. 382 p. -- ed.


Markus Zusak encontrou um meio de escrever um romance ímpar que retrata com muita lucidez os horrores do período Hitleriano, da própria Segunda Guerra Mundial. Uma jovem durante o período da Alemanha nazista lutando intimamente para defender seus princípios, por não se deixar manipular pelo tétrico ideal de Hitler, ao passo que ela amadurece e aflora para o primeiro amor, um sentimento platônico. Zusak ainda chama a atenção para algo muito importante: o poder das palavras, a influência delas sobre o ser humano; o que elas conseguiam – e ainda hoje o logram - levar as pessoas a crer e a fazer.

O livro é uma narrativa da Morte, seu foco é a vida de Liesel e o que a ela for relacionado. Organiza-se em dez partes, cada qual com cerca de quarenta páginas, mais o prólogo onde a narradora apresenta a ela mesma e a nossa protagonista e ainda um epílogo falando sobre a morte de Liesel e o destino de alguns dos personagens secundários. Posteriormente há uma parte dedicada aos agradecimentos do autor e um trecho falando sobre ele.

Nossa narradora mostra-se muito diferente do juízo que lhe fazemos. Em partes do livro ela busca dialogar com o leitor, mostrando que apesar de não ser humana, tem de certa forma sentimentos. Empós apresentar-se ela explica o porquê de seu interesse em Liesel: “O que, por sua vez, me traz ao assunto de que lhe estou falando [...]. É a história de um desses sobreviventes perpétuos – uma especialista em ser deixada para trás.”. Ao final do livro ela reafirma algo que deixa bem claro durante a história: “Os seres humanos me assombram”...

“A menina que roubava livros” conta a história de uma menina de nome Liesel Meminger que, durante uma viagem de trem com destino a cidade alemã de Molching, ao despertar encontra o seu irmão que viajava a seu lado, morto. No trajeto é feita uma parada para inumar o menino, e, é no cemitério onde nossa protagonista faz o primeiro de seus roubos: um dos coveiros, incauto, deixa cair à neve um livro intitulado “Manual do Coveiro”. Em chegando a cidade de destino, Liesel descobre que seria entregue a uma família adotiva; reluta muito em partir dos braços da mãe consanguínea, mas acaba cedendo. Nossa protagonista passa a viver com Hans e Rosa Hubermann, sua nova parentela. A partir de então, Liesel ao decorrer da história, recebe letramento, faz amizades e, passa a roubar livros da biblioteca da mulher do prefeito, Ilsa Hermann (com certo consentimento da proprietária). Ao lado de seu amigo Rudy, ela constrói uma amizade solidária e uma cumplicidade nos furtos, além de um amor castiço e terno...

Ao fim do livro, a cidade de Molching é bombardeada pelas forças Aliadas e, não em tempo as sirenes de alerta foram acionadas. Foi uma chacina. Liesel foi, quiçá, a única sobrevivente da Rua Himmel. Ela passara as noites no porão da humilde casa de número 33, escrevendo em seu livro – um diário que lhe fora presenteado por Ilsa Hermann alguns dias antes. Ora novamente órfã Liesel é adotada por Ilsa Hermann e seu marido. Ilsa perdera o único filho alguns anos antes - o rapaz lutava na guerra. Liesel Meminger cresce, vai morar em Sydney, constitui família e morre em idade avançada.

Esta obra literária, devo admitir, aprazou a este que vos escreve. A ideia de Markus Zusak ao grafar um romance cujo cenário é a Alemanha nazista, retratando os horrores desse período, é deveras interessante. Uma jovem menina que vê (assim qual uma minoria de outras pessoas alemãs) um absurdo nos ideais de Hitler, mas, por coação, mantém a aparência de nazista, muito embora, durante parte da história os Hubermann e Liesel abriguem secretamente um judeu em seu porão.

O livro mostra o caos que foi a Alemanha nesse período: íncolas alemães passando fome com o racionamento de víveres, o temor de ser considerado um traidor ou mesmo de ser alvo de desconfianças por parte dos membros do partido nazista, a coerção para que todos se alistassem a essa facção e, a perseguição aos que se negavam. O fanatismo de maioria dos alemães, o nacionalismo exagerado, a arrogância... A perseguição aos judeus e a quem não fosse etnicamente alemão. O sofrimento das famílias – não só judias, mas inclusive alemãs como também russas e outras tantas - que perdiam seus parentes nas batalhas; das mães que perderam seus filhos ainda pequenos por conta dos bombardeios; pessoas que foram mutiladas pelo conflito... Atrocidades tamanhas que expõem o lado mãos sombrio, perverso e dantesco da natureza humana, capaz de apavorar até mesmo a singular narradora (“os seres humanos me assombram”).

A estruturação desse livro é um pouco diferente do que as dos títulos que já li. A principio foi curioso, até mesmo um pouco “estranho”, mas ao decorrer do livro torna-se conveniente e agradável.
Esta obra possui sem dúvida valor pedagógico; como sempre indigitando o mérito da Literatura qual instrumento de granjear conhecimentos vários. Trata-se de um texto mais indicado, talvez, a alunos a partir do segundo ano do Ensino Médio, dada a qualidade do escrito.

Markus Frank Zusak nasceu em Sydney em 23 de junho de 1975, é famoso pelo seu Best-seller internacional “A menina que roubava livros”, também é autor de “Fighting Ruben Wolf”, “Getting the Girl”, “Eu sou o mensageiro”, dentre outros, todos recebidos com críticas resplandecentes às revistas Publishers Weekly, School Library Journal, KLIATT, The Bulletin e Booklist. Recebeu o Prêmio Livro do Ano para Leitores Mais Velhos, concedido pelo Conselho Australiano de Livros Infantis.

Farias, M.S. "Resenha de 'A menina que roubava livros', de Markus Zusak". Junho de 2012. http://livredialogo.blogspot.com.br/
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